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  As Vindimas.

A tradição das vindimas perde-se já nos anais do tempo e sobrevivendo a mais de 3000 anos de constantes mudanças, chega no entanto aos nossos dias.

 

Segundo se pensa, foi há cerca de 4000 anos que entre os rios Tejo e Sado, se plantaram e cultivaram as primeiras vinhas pela mão dos Tartéssios, considerados os fundadores da primeira civilização da Península Ibérica, tornando-se também os primeiros produtores de vinho nesta região. Com a chegada dos Fenícios no século X A.C., vieram também novas castas e o vinho português começa a ultrapassar os limites da Península Ibérica.

 

Já no século VII A.C., os Gregos instalaram-se no nosso território desenvolvendo a cultura da vinha e a produção de vinho. O culto a Dionísio (Deus do vinho) transformou a pisa da uva numa grande festa.

 

Também os Celtas além de introduzirem novas castas de uvas mantiveram as tradições de cultivo e de produção bem como dos festejos alusivos a esta atividade.

 

Os Romanos, século II A.C., modernizaram a cultura da vinha introduzindo também o método de pisar a uva com os pés em grandes tanques de pedra, os lagares. A tradição da festa manteve-se embora com algumas alterações e passou a ser dedicada ao Deus Baco, apelidando-se estes festejos de Bacanais.

 

Figura 271 – Painel romano retratando a pisa das uvas.

Vindimas. pisar uvas

 

As civilizações que se seguiram à queda do Império Romano deram continuidade à tradição das vindimas e à produção de vinho, embora os festejos passassem a subjugar-se às práticas cristãs.

 

Em 1143 o vinho português era o produto mais exportado e no século XIV, a aliança entre Portugal e Inglaterra abre novas rotas e mercados no norte da Europa sendo o vinho carregado no Porto um vinho de fama comprovada no mundo conhecido. Sendo o vinho nessa época, uma bebida de reis, as caravelas dos descobrimentos saíam sempre com o vinho português levando bem longe as suas qualidades.

 

O seu comércio sofreu novo incentivo em 1703 com o Tratado de Methuen em que os Portugueses se comprometiam a consumir os têxteis Ingleses e os estes a consumir os vinhos Portugueses. Esta medida conduziu à incrementação da plantação de vinha em Portugal embora fragilizando os outros sectores de atividade o que causou uma elevada deficiência económica que nem mesmo o ouro e outras riquezas vindas das ex-colónias incluindo o Brasil lograram atenuar.

 

No século XVIII, o Marquês de Pombal tentou inverter a situação, mas o desinteresse da aristocracia impediu que a modernização económica se levasse a cabo.

 

Em suma, fomos e continuamos a ser um país de péssimos gestores da propriedade do estado em que a aristocracia se assemelha ao míldio irradiando a sua podridão, pagando os mais fracos a sua má gestão.

 

Alheias no entanto à História, as estações do ano sucedem-se, tal como aconteceu durante séculos e séculos. O final do Verão chega de novo arrastando consigo o princípio do Outono e com ele nova época de vindimas se abre.

 

As uvas aguardam pacientemente nas videiras prontas para serem colhidas, num trabalho que decorre em ambiente de festa e convívio, para depois ter lugar a produção de vinho. Esta tradição, apesar das invitáveis modernizações, em certos aspectos apresenta ainda semelhanças com o passado mas decididamente já não é o que era.

 

A vindima é o período que engloba todas as atividades desde o corte da uva até à produção de vinho.

 

No passado, as vindimas constituíram um verdadeiro marco etnográfico sendo a época da colheita das uvas considerada uma autêntica ocasião festiva em que familiares e amigos combinavam entre si as datas da vindima, permitindo o intercâmbio da mão-de-obra.

 

Tal como nas desfolhadas, também a época das vindimas era aproveitada para um pouquinho mais de intimidade entre os casais de namorados, que normalmente se colocavam na mesma carreira, embora sob o mesmo rigoroso controlo da família e não apenas desta como era prática comum noutros tempos.

 

vindimas

Quando os raios de sol tinham já aquecido as uvas iniciava-se o trabalho em ambiente alegre e descontraído trocando piadas e brincadeiras embora concentrados nas tarefas que cada um iria desempenhar. Normalmente, mulheres e jovens iniciavam o corte da uva, enquanto os homens espalhavam cestos pelos bardos. Entretanto já havia quem gritasse: -“Cesta!”.

 

Figura 272 – Cortando uvas na vindima.

 

Era sinal que a cesta estava cheia e requeria a presença de um homem para despejar no cesto devolvendo a cesta ao cortador ou cortadora de uvas. A partir das primeiras cestas, a rotina de as despejar era constante.

 

Quando os cestos estavam cheios, os homens carregavam-nos ao ombro para as dornas que haviam sido colocadas no terreno anteriormente em cima do carro de bois ou na carroça para uma vaca ou boi.

Em tempos mais remotos, tudo se fazia em cestas e cestos de verga e dornas de madeira carregadas em carros de bois. A modernização levou à utilização de baldes de plástico, tanto para a apanha das uvas como para as guardar, até serem despejadas nas dornas metálicas que o trator carrega e que vai chegar no dia e hora marcada para as transportar.

 

vindima

 

Figura 273 – Cestos de verga.

 

Porque as vindimas eram uma verdadeira festa, os intervenientes seguiam para as leiras em ritmo de cortejo, cantando e dançando o que nos tempos modernos já se perdeu.

 

vindimas

No entanto a alegria e as modinhas dessa época ainda se vão ouvindo unindo-se ao chilrear das aves.

 

Este quadro é depois emoldurado pelos tons outonais da folhagem cujas cores se intensificam com o bailar dos raios de sol na superfície das folhas, assemelhando-se a uma pintura paradisíaca.

 

Figura 274 – Transporte das uvas noutros tempos.

 

 

A meio da manhã petiscava-se alguma coisa e mais tarde chegava a hora de almoço para um descanso merecido que decorria em ambiente alegre e festivo. À noite esse ambiente continuava nos lagares onde de braços dados ou cada um por seu lado, os homens procediam à primeira pisa de uvas.

 

Atualmente o cariz de festa quase se perdeu, mas o convívio, a união dos familiares e amigos girando em torno do ritual das vindimas, permanece e pouco tempo depois do sol acordar, equipados de tesoura e balde seguem alegremente para as vinhas para iniciar o corte das uvas.

 

Figura 275 – Baldes usados atualmentena vindima.

 

vindimas

 

A grande maioria das uvas, que outrora seguiam para os lagares, seguem agora um rumo diferente, sendo entregues em cooperativas vinícolas para serem mecanicamente processadas e transformadas no conhecido vinho português.

 

carro de bois. vindimas

 

Também nos lagares havia cantigas próprias para a ocasião assim como brincadeiras entre os intervenientes enquanto as uvas iam sendo pisadas gradual e lentamente pois o primeiro corte é essencial para uma boa fermentação.

 

Figura 276 – Carro de bois que transportava as dornas.

 

 

Após fermentação, todos os resíduos sólidos vêm à superfície formando a “manta” que nas duas vezes seguintes, também deverá ser baixada lentamente.

Ao longo deste processo o vinho obtido adquire a cor tinta pelo contacto com as cascas das uvas. Quando é utilizado o esmagador em vez do lagar, como não existe maceração das cascas, o vinho adquire sempre a cor branca.

 

A tradição já não é efetivamente o que era. O ambiente festivo desapareceu gradualmente e na atualidade, embora se note alguma alegria e boa disposição tanto na vindima como no lagar esse ambiente apenas se aproxima do que era.

 

vindimas

Figura 277 – Pisa das uvas no lagar.

 

É pena que todo o folclore de outrora se tenha diluído no lento passar dos anos fruto da introdução das novas tecnologias e como consequência da alteração de comportamentos que se tem verificado nas sociedades modernas, restando apenas a entreajuda, o convívio e a união quer familiar quer de amigos.

 

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