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  Lenda Dos  Passarinhos

“Segundo conta o povo, Fructuoso era um rapaz muito devotado à religião mostrando desde muito cedo ser um rapaz cheio de virtudes. Como as searas começavam a dourar, os passarinhos encontravam nelas fausto alimento e para minimizar os prejuízos o pai de Fructuoso mandava-o guardar os passarinhos.

 

Um dia, estando no Paçal a enchotar os pássaros, ouviu o sino a tocar para a missa e sentiu uma vontade enorme de ir assistir. Havia no Paçal um poço e como não viu mais nada onde os guardar, falou aos passarinhos pedindo-lhe para entrarem no poço tapando a entrada com uma grade de gradar a terra, pedindo aos passarinhos para não sairem sem ele voltar.

 

Durante a missa o pai notou que Fructuoso estava na igreja em vêz de estar a guardar os pássaros conforme tinha mandado e começou a pensar num ajuste de contas quando a missa terminasse.

 

No final da missa o pai de Fructuoso dirige-se ao filho e perguntou porque não tinha cumprido as suas ordens. Fructuoso respondeu para não se preocupar pois tinha fechado os passarinhos no poço.

 

Perante as gargalhadas de quem ouviu, pai e filho foram para o Paçal e quando Frutuoso tirou a grade dando ordens à passarada para sair, uma enorme quantidade de passarinhos debandaram do poço deixando todos de boca aberta dizendo que era milagre.”

 

Também esta lenda tem atualmente versões e texto diferentes dependendo dos sitios onde se lê. Se num texto se tratava da missa de Domingo de festa, noutro texto era a missa de Segunda-Feira. Se num lado se lê que os passarinhos foram aprisionados num palheiro sem teto, noutro lado lê-se que a entrada foi tapada com uma grade. Num outro lado pode ler-se também que os passarinhos foram aprisionados num poço que por sua vez foi tapado com uma cancela. Uma outra versão conta que os passarinhos foram aprisionados na mina.

 

No CEAO-Centro de Estudos Ataíde Oliveira, no endereço www.lendarium.org, encontramos esta lenda, recolhida em Constantim, registada da forma que a figura seguinte documenta.

 

Claro que numa lenda, nunca se saberá qual a versão mais correta mas partindo do princípio que a versão mais antiga será a que mais se aproxima do texto original da lenda prescindo pois de todas as histórias enriquecidas com argumentos acrescentados no sentido de alindar o texto, mas que na realidade não dão contributo algum para a preservação da lenda.

 

Neste mesmo Centro de Estudos, podemos encontrar outra versão da mesma lenda com a referência APL 931, esta já mais elaborada desviando-se bastante do teor da lenda simples.

 

 

Figura 239 – Lenda dos passarinhos registada no CEAO-Centro de Estudos Ataíde Oliveira.

 

Em diversos sítios da Internet podemos encontrar também a lenda e por norma a escolha para a sua publicação recai na mais elaborada o que por conseguinte faz recair a escolha sobre a versão menos fiável.

 

Convém não esquecer que as lendas, têm normalmente muitas centenas de anos e têm portanto origem no tempo em que a esmagadora maioria da população não tinha qualquer formação académica. Por essa razão, serão sempre versões simplistas.

 

É no entanto óbvio que por se tratar de uma lenda, todas as versões deverão ser consideradas. Mas também devemos relacionar os dados existentes no sentido de obter um texto que nos conduza a uma versão da lenda o mais original possível. Para isso seria necessário encontrar registos, que quanto mais antigos fossem melhor.

 

Nos livros consultados, a referência mais antiga está no Agiológio Lusitano, Vol. II, Pág. 595 de 1657, (ver fig. 197) e as pessoas acreditavam nela com tanto fervor que ainda há bem poucos anos aspergiam os campos com a água da mina de S. Fructuoso para os proteger das mais diversas pragas. Essa água deveria ser colhida pelo S. João antes do nascer do sol.

 

Sempre a ouvi contar, dizendo que S. Fructuoso tinha aprisionado os passarinhos na mina, porém não me parece sequer que na altura a mina existisse enquanto que um poço, esse talvêz.

 

Numa lenda, todos têm razão e ninguém tem razão. No entanto relativamente à aproximação à lenda original, tem ainda menos razão aquele que inserir pormenores concretos ou que lhe dê um texto muito elaborado, pois acaba por transformar a lenda num conto ou numa história pensada para ter este ou aquele final.

 

O Centro de Estudos e de Letras da UTAD e o CEAO ao registar as lendas junto das populações, fazem-no sempre que possível junto das pessoas mais idosas, exatamente para evitar a deturpação dos textos, registando inclusivamente o sotaque com que são contadas. Este registo permanecerá imutável daqui em diante e terá a capacidade de mostrar no futuro de que forma falavam as pessoas. Portanto, este é um trabalho exemplar, merecedor de aplausos e digno de ser seguido como exemplo.

 

Uma lenda envolve mistério e falta de pormenor, muitas vezes com difícil ligação entre si, pois quando começaram a passar de boca em boca, quem as passava não tinha capacidades linguísticas para interligar o que não conseguia entender e muito menos descrever.

 

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