igreja matriz - história
Olhando a igreja matriz de Constantim, reconstruída na primeira metade do Séc. XVIII, em 1726, podemos apreciar o trabalho e perícia dos artífices da época. Apesar de não ser das mais ricas em arquitectura exterior, notam-se no entanto bonitos traços na fachada principal denotando um certo gosto em dar vida ao conjunto.
Apesar de ostentar a data de 1726, podem observar-se uma série de elementos que indicam a existência de outras construções bem anteriores.
Até à fundação da diocese de Vila Real, em 1922, a igreja de Sta. Maria da Feira de Constantim pertenceu ao arcebispado de Braga, padroado do convento de S. Martinho de Caramos que pertencia à Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho.
No entanto a Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, estavam sob jurisdição do convento de Sta. Cruz de Coimbra e em 1594 as igrejas pertencentes ao convento de S. Martinho de Caramos são entregues à jurisdição do convento de Santa Cruz de Coimbra, conforme figura seguinte, informação do Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Por isso, todos os documentos relativos à igreja de Constantim transitaram primeiro para o convento de Mafra e posteriormente para Coimbra, ficando a cargo da congregação do Mosteiro de Santa Cruz.
Figura 102 – Informação da Torre do Tombo sobre a doação do Mosteiro de Caramos e seus padroados.
De acordo com um estudo retirado do site do IGESPAR, até 1732, a igreja de Constantim era composta por cinco capelas: A capela de Santa Ana, capela de Nª Senhora do Rosário, capela de S. Lourenço, capela de Nª Sra. da Piedade e a capela do Santo Nome de Jesus.
Documentalmente, não consegui ainda comprovar estas palavras, mas de acordo com esse estudo, concluído por Isabel Sereno e João Santos 1994 / Paula Noé 2004, “em 1732, a Igreja de Constantim era do padroado do Convento de São Martinho de Caramos da Província de Entre Douro e Minho, o qual era da Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, e o prior do convento apresentava a igreja com título de vigário; tinha uma Irmandade das Almas, com grande número de irmãos, cinco capelas, com suas instituições de morgados e bens a elas vinculados: a do Rosário, administrada por João de Sousa de Sequeira, da cidade de Lisboa; a de Santa Ana, administrada por Bernardo José Teixeira Coelho de Melo Pinto, de Vila Real; a capela de São Lourenço, administrada pelo conde de Alvor, governador de Armas da Província; a de Nossa Senhora da Piedade, instituída por Brites Alves, viúva de um certo Borges (Diogo Borges?), e administrada por Francisco Borges, de Ponte de Lima, com obrigação de duas missas semanais; e a capela do Santo Nome de Jesus, instituída por António Cardoso, do lugar de Constantim, e administrada por Francisco Dias Farroco, com obrigação de seis missas por ano”.
Sabe-se no entanto que havia administradores anteriores para as capelas da Igreja de Constantim como Jorge da Câmara de Noronha, que por volta de 1659 recebeu mercê para administrar a capela de Constantim, mas o registo da Torre do Tombo, não especifica a capela. Esta informação revela que a igreja já existia antes da reconstrução ou construção terminada em 1726.
Figura 103 – Administrador de uma das Capelas da Igreja de Constantim
Sabe-se também que em 20 de Junho de 1506, a administração da capela de S. Lourenço foi entregue a Simão de Miranda. A referência do arquivo nacional, no registo que a figura seguinte documenta, permite-nos conhecer os nomes dos anteriores administradores. Mas qual seria a sua localização na igreja primitiva?
Figura 104 – Nomeação do Administrador da Capela de S. Lourenço.
No intuito de tentar entender qual seria a localização das capelas pertencentes à igreja de Sta. Maria da Feira de Constantim e após as considerações anteriores, penso que não se andará muito equivocado, se concluirmos que aproximadamente, seria a que se apresenta na figura seguinte (104-A).
Figura 104-A – Provável distribuição das Capelas na Igreja de Constantim
Fica porém a dúvida se a configuração da igreja seria a que hoje apresenta.
No entanto, a antiga igreja, remonta a épocas bem mais remotas, pois como diz o mesmo estudo retirado do site do IGESPAR, no capítulo da cronologia; “1164, 10 Abril / Novembro - falecimento de São Frutuoso, ou Frutuoso Gonçalves, natural de Constantim, e em cuja igreja seria sepultado depois de lá exercer a paroquialidade, originando um grande culto;
1258 - Inquirições na paróquia de Santa Maria da Feira de Constantim;
1321 - D. Dinis visita Constantim para ver a relíquia da Santa Cabeça de São Frutuoso;
1410, 13 Outubro - instituição testamentária de Fernão Vasques da Granja, cavaleiro, e sua mulher, Inês Lourença, estipulando que depois dos seus falecimentos fossem sepultados na capela de Nossa Senhora do Rosário que possuíam na igreja; declaravam o seu sobrinho Rodrigo Afonso como responsável pelo cumprimento destas determinações e de manter uma lâmpada acesa diante da Santa Maria e outra onde os administradores estavam sepultados; posteriormente, o vínculo passou para a Coroa e dele se fez mercê ao desembargador Domingos de Sousa Santiago Ferraz;
1472, 20 Dezembro - D. Afonso V une no único morgado de Santa Ana duas capelas, a de São Brás, jazigo da família, com missa quotidiana, a de sábado cantada, e a do Hospital, de invocação do Espírito Santo, ou do Bom Jesus do Hospital, com quatro missas cada semana, e fez dela mercê a João Teixeira de Macedo, do Conselho do Rei;
1505 - instituição de missas na capela de São Lourenço por Francisco de Melo e sua mulher D. Brites Pereira, moradores no lugar de Constantim, por alma de seu único filho que morrera;
1671 - data da inscrição no interior da capela lateral de São Frutuoso, assinalando a sua construção por e a expensas de António Cordeiro; 1721 - documento refere que a fama milagrosa da relíquia da Santa Cabeça de São Frutuoso, colocada num sacrário, era conhecida não só em Portugal, mas também na Galiza e em Castela; para além dos vários milagres que se atribui à relíquia, a tradição diz ser de especial virtude para as pessoas mordidas por animais danados, que bastavam tocá-la uma vez para ficarem curadas, mas se a mordida fizesse ferida tinham de tocá-la 9 dias contínuos e fazer romaria por fora da igreja; dizia-se ainda que o pão tocado na relíquia nunca se estragava;
1726 - data inscrita na verga do portal principal”.
Pelas informações anteriores, verificamos que havia capacidade para sepultar os corpos, nas próprias capelas, por isso fica a dúvida se as capelas seriam independentes, embora unidas ou se estariam dentro do corpo principal da igreja. Sabemos que existia uma outra igreja, de construção medieval e segundo parece, de acordo com as informações obtidas no site do IGESPAR, estava construída num lago aí existente conforme podemos constatar no texto da figura que se segue.
Figura 105 – Nota tirada dos registos do IGESPAR sobre a localização da igreja..
Também o culto a S. Fructuoso remonta já ao Séc. XII ou XIII e tendo ele sido pároco em Constantim será pois óbvia a existência de uma igreja muito antiga a que não deverá ser completamente alheia a capela anexa do Senhor dos Passos construída em estilo românico, embora o Igespar atribua a sua edificação ao século XV e/ou XVI.
Mas provavelmente, o testemunho mais antigo a atestar a antiguidade da igreja, pode ser o símbolo gravado na pedra que a figura seguinte documenta.
Figura 106 – Pedra gravada com o que parece ser a cruz dos Templários.
Segundo parece, trata-se de uma Cruz Orbicular, também chamada de “Cruz Pátea Alesada” e era uma das cruzes usadas pelos Templários (ver esquema ao lado), não se sabendo se fazia parte da primeira igreja erigida ou se apenas foi colocado aquando da sua construção tendo sido trazida de outro lado.
O facto de a igreja de Constantim ter sido doada por D. Afonso Henriques em 1154 e esta doação ter sido confirmada por D. Dinis em 1321 é também prova evidente da antiguidade da nossa primitiva igreja.
Estas palavras também estão descritas em “Os Cónegos Regrantes de Santo Agostinho no Norte de Portugal em Finais da Idade Média: Dos Alvores de Trezentos à Congregação de Santa Cruz”, uma dissertação de doutoramento em letras, área de História, especialidade de História da Idade Média da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, da autoria do Dr. Aires Gomes Fernandes, 2011.
Figura 107 – Igrejas de Vila Real doadas ao convento de Caramos, na dissertação de doutoramento do Dr. Aires Gomes.
Figura 108 e 109 - Dissertação de doutoramento do Dr. Aires Gomes.
Recorrendo ao site do IGESPAR, descobrimos na Nota Histórico-Artística, que a capela do Senhor Jesus, foi mandada reconstruir em 1738, pelo padre Serafim Alvarez.
Figura 110 – Nota Histórico-artística do site do IGESPAR, sobre a capela do Senhor Jesus.
Nesse caso, uma das antigas cinco capelas, a capela do Santo Nome de Jesus, foi erigida no lugar da atual capela de S. Fructuoso, capela que havia sido construída em 1671 por António Cordeiro, conforme inscrição aí existente. Fica apenas a dúvida de como seria a capela que lá existia, qual a sua área e a sua forma, pois pelas palavras que se acabam de ler é evidente que existia uma capela primitiva, capela essa que foi depois construída de raiz por António Cordeiro que a mandou edificar ou sobre os escombros da anterior, ou porque se terá desmoronado devido ao falecimento dos seus administradores e por esta razão terá sido abandonada.
Figura 111 – Inscrição na capela de S. Fructuoso.
Também o desenho que António Cordeiro escolheu quando a mandou edificar, permanece em mistério, restando finalmente a reedificação de Serafim Alvarez, que desde 1738 até hoje se mantém erguida, contando a sua história.
Este raciocínio vai ao encontro das palavras proferidas numa entrevista dada ao periódico Vila-Realense “Notícias de Vila Real”, pelo Padre Norberto Portelinha, antigo pároco da freguesia, no dia 04-Nov-2008 e cujas palavras se transcrevem na figura seguinte.
Figura 112 – Entrevista dada ao periódico Notícias de Vila Real em 04-11-2008.
Na Torre do Tombo, com a referência PT/TT/TSO-CG/A/008-002/281, existe um documento relativo ao Padre António Cordeiro que se encontra em mau estado de conservação.
Trata-se de um pedido de ingresso como comissário do Tribunal do Santo Ofício e que foi recusado por falta de habilitações para tal cargo.
Terá sido o mesmo António Cordeiro que mandou construir a capela? Talvêz não, pois existem cerca de 100 anos a separar os dois eventos. Seja como for, a localização das capelas atrás citadas bem como a disposição relativamente ao corpo principal da igreja continua por esclarecer, e era também da mais elevada importância saber mais pormenores sobre elas.
Figura 113 – Registo da Torre do Tombo relativo ao documento de pretendente a comissário do Tribunal do Santo Ofício.
Encontrar um desenho, uma planta ou um pormenor da sua construção seria gratificante e um testemunho do mais alto valor, já que também o site do IGESPAR nos deixa dúvidas. Pode haver erro na transcrição do nome da capela, já que no site se lê que a capela foi construída em 1738, quando a inscrição diz textualmente que foi reedificada.
A partir do século XVII, apresentava já a igreja sérios danos de forma que todo o edifício foi depois profundamente intervencionado nos séculos XVII e XVIII ostentando desde então na frontaria a data de 1726.
O primeiro casamento documentado, data de 1736 e dois anos mais tarde é reedificada a atual capela de S. Frutuoso pelo pároco Serafim Alvarez.
O primeiro óbito documentado acontece em 30 de Agosto de 1777, pelo falecimento do Padre Manoel Ferreira, natural de Constantim.
Figura 114 – Registo do primeiro casamento documentado na igreja de Constantim.
Em 12 de Fevereiro de 1747 é assinado contrato com o mestre pedreiro António Fernandes, de Mateus, para fazer a capela-mor e sacristia da igreja, por 297$000, o qual se comprometia a terminar a obra durante o mês de Outubro do mesmo ano, após o que seria vistoriada por dois mestres do mesmo ofício. Estiveram presentes ao acto os oficiais da igreja Luís Correia e Lucas André Ribeiro, "homens de contas da igreja", e o pároco Manuel Leite de Lemos, reitor da igreja.
Em 1751 assistimos ao primeiro baptismo documentado na igreja de Constantim cujo registo se apresenta nesta página e em 20 de Janeiro de 1764, por decreto do Arcebispo de Braga, D. Gaspar, são transladados para a restaurada igreja de Constantim os ossos de S. Fructuoso.
Figura 115 – Registo do primeiro batizado documentado na igreja de Constantim.
Figura 116 – Registo do primeiro óbito documentado na igreja de Constantim.
A igreja mereceu entretanto a classificação de Imóvel de Interesse Público (IIP), pelo Decreto-Lei nº 45/93, DR 1.ª série, n.º 280 de 30 de Novembro 1993, possuindo o nº IPA.00006003.
Figura 118 – Decreto-Lei nomeando Imóvel de Interesse Público.
Como o tempo e as condições climatéricas não perdoam, o telhado da sacristia acaba por ruir em 1979 e as coberturas da igreja e das capelas anexas ameaçavam seguir o mesmo caminho.
Foi então feita exposição aos Monumentos Nacionais da zona Norte, solicitando ajuda técnica e financeira para restaurar a igreja.
Figura 119 – Requerimento a solicitar ajuda técnica e financeira para restaurar a igreja - Pág. 1.
Figura 120 – Requerimento a solicitar ajuda técnica e financeira para restaurar a igreja - Pág. 2.
Figura 120-A – Resposta da Direção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais.
Apesar do parecer positivo essa ajuda nunca chegou a concretizar-se e o restauro foi sendo feito gradualmente a partir de 1985 pela comissão fabriqueira, tendo sido concluído em 1993, num esforço conjunto da comissão fabriqueira, Monumentos Nacionais, Câmara de Vila Real e Junta de Freguesia.
Antes do restauro, o estado de conservação da igreja era o que as figuras seguintes documentam.
Figura 121 – Estado de degradação antes das obras de restauro.
As obras de beneficiação visaram também repor os originais traços da igreja, eliminando as posteriores alterações que gradualmente foram sendo feitas ao longo dos anos, retirando o tecto da capela-mor que havia sido posteriormente colocado, retirar os dois altares colocados junto do arco triunfal, repor o pavimento original, eliminar o muro colocado em frente à porta de entrada da igreja, requalificar o espaço circundante da igreja (adro), bem como outros pormenores adicionais que eventualmente afetassem a configuração original do monumento.
Figura 122 – Interior da nave durante as obras de restauro.
Figura 123 – Retábulo transferido para a capela de S. Fructuoso após as obras de restauro.
O retábulo colocado de ângulo encostado ao arco triunfal no lado do Evangelho (lado esquerdo de quem está de frente para o altar-mor) foi transferido para a capela de S. Fructuoso enquanto o que se localizava no lado oposto se desconhece o seu paradeiro. A imagem do Senhor dos Passos foi colocada num pedestal junto ao arco triunfal no lado do evangelho onde estava o Sagrado Coração de Jesus e este passou para um pedestal no lado oposto da nave.
Figura 124 – Pormenores do teto da capela-mor até às obras de restauro.
Figura 125 – Pormenor da requalificação do adro.
Após a conclusão das obras, o aspecto tornou-se bem mais atraente, a acústica ficou francamente beneficiada, a iluminação tornou-se mais eficaz e funcional e o ambiente ficou mais acolhedor.
Também as zonas circundantes beneficiaram dos melhoramentos e sabe bem caminhar naquele espaço perfeitamente conjugado com a idade e simbolismo do monumento que ali se mantem erguido, para corresponder aos desejos e anseios de quem o frequenta ou visita.
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