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CONSTANTIM NA AtualiDADE

Roca e o Fuso

 

Falando na roca e no inseparável fuso, pode parecer que são dois objetos de conceção simples e que pouco mais há a acrescentar.

Embora mais ou menos elaborada, a roca consiste basicamente numa cana que enquanto humedecida, se abre num dos extremos com vários entalhes para lhe dar um formato oval saliente, através de cujos entalhes se introduz depois o material a fiar.

 

O fuso é um objeto pontiagudo em forma de gota que pode também possuir uma rodela de madeira na parte mais grossa. Uma peça metálica de olhal aberto é inserida na parte mais fina do fuso para poder passar o fio já preparado e pronto a enrolar, impedindo ao mesmo tempo que se desenrole o fio já preparado. Em vez da peça metálica, pode ser feito um entalhe helicoidal para inserir o fio.

Figura 339 – Roca e Fuso.

Depois, a envolver a roca, é colocado o material a fiar apertando-se com um fio ou uma tira de tecido, para que o material a fiar se separe gradualmente.

Girando o fuso com uma mão e auxiliando o enrolar dos fios soltos com a outra, começa a formar-se um fio mais grosso que mais tarde servirá para tecer diversos artigos, tanto de decoração como de vestuário.

No caso da lã, tudo começa com a pastorícia com a alimentação e manutenção das ovelhas seguindo-se depois a tosquia depois do Inverno para que a lã volte a crescer até à chegada do próximo Inverno protegendo a ovelha do frio.

Com o saber acumulado ao longo dos anos, é depois feita a seleção da lã de acordo com a qualidade seguindo-se o processo de lavagem da lã.

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Em água quente, mas à temperatura certa, a lã é mergulhada para extrair a sujidade e a gordura natural da lã, a lanolina, sem deixar a lã compactar-se dentro da água. Depois deste passo, a lã é lavada em água fria corrente de forma a limpar a restante sujidade que a lã tiver sendo depois bem escorrida e colocada ao sol a secar.

Depois de seca a lã é “esgadelhada”, o que equivale a dizer que era aberta no sentido dos fios, soltando os fios mais compactados e removendo ao mesmo tempo partículas de sujidade que não tenham sido retiradas na lavagem, mas sempre com o cuidado de não partir os fios. Obtêm-se então pequenas mechas prontas para o próximo passo.

 

As cardas são os utensílios a utilizar nesta etapa, cardar a lã. São feitas de madeira de estrutura retangular possuindo várias filas de dentes de ferro ou aço. A lã esgadelhada é colocada numa delas e com a outra escova-se a lã movendo uma das cardas de um lado para o outro até a lã estar bem difusa em ambas as cardas. Depois de retirada das cardas está pronta para ser introduzida na roca para ser fiada.

Só após todo este trabalho, é que a roca e o seu fuso podem executar a sua função, habilmente conduzidos pelos dedos experientes das fiandeiras de antigamente, transformando a lã solta em fio.

Figura 340 – Esgadelhar a lã.

Figura 341 – Cardar a lã.

Figura 342 – Fiar a lã.

Figura 343 – Sarilho para fazer as meadas e novelos.

 

Com o fio já feito e enrolado no fuso, é necessário convertê-lo em meadas facilitando um novo processo de lavagem da lã antes de ser utilizada. Para isso recorre-se ao “Sarilho”, dispositivo em forma de sinal “+” que ao girar transfere o fio do fuso convertendo em meada.

O sarilho utilizava-se também para transformar a meada em novelo, para finalmente poderem tricotar-se as peças de vestuário.

 

Este processo, chamado de dobar, podia ser feito com recurso a uma outra pessoa que segurava a meada com ambos os braços.

Em tempos mais recuados quase não havia casa que nas horas vagas ou no final do dia, não houvesse uma mulher à janela ou sentada na soleira da porta a fiar lã com a sua roca ou a fazer meias quentes para a família.

O progresso trouxe alterações radicais a tudo isto, podendo já adquirir-se no mercado novelos já preparados para tricotar de todas as cores e espessuras colocando todos estes utensílios na secção de antiguidades e memórias, perdendo-se definitivamente esta parcela da nossa etnografia.

Também o linho em tempos era cultivado, no entanto obedecia a outros processos de manuseio até à fase da tecelagem que requeria um tear e embora em Constantim já se tivesse cultivado o linho, penso que a sua tecelagem não foi nunca uma atividade praticada em Constantim, pelo que o linho cultivado seria para venda. Por esta razão o “ciclo do linho” não é descrito.

Dada a sua inseparável relação com o fuso, a roca perdurará porém por muitos mais anos na lembrança de todos já que o saber popular a eternizou com a expressão:

 

-“Cada terra com seu uso, cada roca com seu fuso”.

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