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CONSTANTIM NA AtualiDADE

O Ciclo do Pão

​Figura 344 – Uma Gamela.

 

A gamela, velhinho objeto de madeira, de formas e tamanhos variados, utilizado principalmente para as tarefas relacionadas com o pão. O costume em Constantim era cozer as broas de milho amarelo. Depois de trocado o cereal por farinha, esta era peneirada já na gamela. Depois de peneirada juntava-se água morna já com sal e um pouco de fermento que por norma se pedia a uma vizinha, que quando precisasse pedia a outra vizinha e assim sucessivamente.

Só se necessitava saber quem tinha recentemente cozido pão.

 

Com os ingredientes na gamela, a farinha era amassada misturando muito bem todos os ingredientes, até que ficasse uma massa com uma determinada consistência. Quando a massa se não agarrasse às mãos, estava no ponto. Depois, encostava-se a massa a um dos lados, alisava-se bem para que não ficassem rachas por onde pudesse entrar frio e depois de polvilhar a massa com um pouco de farinha, a massa era tapada com um lençol branco por baixo e alguns cobertores ou mantas para que a massa ficasse bem agasalhada e puder levedar bem.

Antes de ser tapada fazia-se com a mão um sinal da cruz na massa enquanto se acompanhava com a seguinte reza:

 

S. João te faça pão.

S. Vicente te acrescente.

S. Fructuoso te faça gostoso.

S.ta Maria da Feira te faça como a flor da laranjeira.

 

Durante mais ou menos duas horas, a massa ficava a levedar, até estar pronta a ir ao forno. Enquanto a massa levedava queimava-se lenha no forno para que ficasse bem quente e finalmente, depois de retirar a cinza e a quase totalidade das brasas, a massa era fracionada de acordo com o tamanho a dar às broas. Um pedaço desta massa era guardado como fermento para a próxima vez.

Com um pouco de farinha num recipiente, (uma bacia pequena ou um alguidar), colocavam-se as porções de massa e faziam-se rodar algumas vezes para lhe dar uma forma aproximada da broa, ou por outras palavras tendia-se a massa. Finalmente era colocada na pá do forno que com o seu cabo comprido permitia dispor as broas de forma mais ou menos uniforme no interior do forno quente.

Ao introduzir cada broa, eram proferidas estas palavras: “Cresça o pão no forno e a graça de Deus pelo mundo todo”.

Depois de todas as broas serem colocadas, fechava-se a porta do forno de forma a impedir o calor de sair. Se mais recentemente se utilizava lama misturada com cinza, em tempos mais antigos utilizava-se a bosta de vaca, que devido ao elevado teor de fibras e ausência de cheiro desagradável, tornava-se no vedante perfeito para tapar os fornos. Uma hora ou uma hora e meia depois, as broas coradinhas saiam do forno com a sua côdea estaladiça mais escura traçando desenhos assimétricos na parte superior da broa.

Outros utensílios no entanto, faziam parte deste ritual, a caixa do milho e a rasa, respetivamente para guardar e medir o milho, a peneira para peneirar a farinha e a pá do forno que colocava o pão e o retirava do forno.

 

​Figura 345 – Caixa do milho e a rasa.

 

​Figura 346 – A peneira.

​Figura 347 – A pá do forno.

 

Não encontrei qualquer registo que indiciasse a existência de fornos comunitários em Constantim, mas certamente deverá ter existido pelo um, pois era prática comum na idade média, principalmente para atender às necessidades daqueles que não tinham possibilidades de construir o seu. Seria no mínimo agradável, descobrir qualquer prova da sua existência. Onde se localizaria? Que aspeto tinha?

O facto de existir a Rua do Forno, penso ser prova inequívoca da sua existência noutros tempos e obviamente era aí que se localizava, mas qual o sitio exato? Como era? Porque se não preservou uma importante peça da nossa etnografia? O que resta dele?

O forno comunitário, não é um monumento de grande valor arquitetónico ou histórico, porém era um importante recurso para a população e era o barómetro da sociedade da época.

Se o forno estava em atividade, significava que a produção tinha sido boa e não havia fome, em caso contrário a população sofria por falta de alimento. Além disso o forno era tradicionalmente o ponto de encontro de jovens que aproveitavam o calor existente no local para prolongar um pouco mais as tardes frias e também dos outros moradores para se manterem atualizados trocando as novidades da aldeia.

Perdeu-se pois mais um marco etnográfico de Constantim que nunca será recuperado, um ponto de interesse que por falta de vontade nunca mais existirá para ser mostrado às gerações atuais, às vindouras e a eventuais visitantes, que sem pontos de interesse histórico ou etnográfico não se deslocam à nossa terra que cada vez mais passa despercebida.

A cozedura da broa de forma artesanal, está também a morrer se é que não morreu já, o que é de lamentar, pois constitui uma grande perda para a etnografia Constantinense.

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